Em abril de 1946, o então presidente Eurico Gaspar Dutra assinou um decreto-lei que mudaria para sempre o cenário dos jogos de sorte no Brasil. A medida proibiu cassinos e todas as atividades ligadas à exploração dos jogos de sorte, impactando profundamente o turismo e o entretenimento no país. Essa proibição permanece até hoje, quase 80 anos depois, e tem suas raízes em fatores que vão além da política: elementos religiosos e morais também desempenharam um papel importante nessa decisão.
Mas qual foi o papel da primeira-dama Carmela Dutra, conhecida como “dona Santinha“, nesse contexto? E como esse veto ainda ecoa nos debates atuais sobre a legalização dos cassinos e bingos no Brasil? Vamos explorar esses pontos.
A influência de “Dona Santinha” na proibição
Carmela Dutra, esposa de Eurico Gaspar Dutra, foi uma figura influente na época. Sua religiosidade católica, junto com seu posicionamento moral, teria sido um dos fatores que levaram à proibição dos jogos. Embora não haja documentos oficiais que comprovem sua intervenção direta na decisão do marido, há diversas histórias e especulações sobre sua influência no governo, especialmente em questões que envolviam a moral e os costumes da sociedade.
De acordo com o historiador Fabio Souza Lima, a primeira-dama era muito próxima do cardeal Jaime Câmara, arcebispo do Rio de Janeiro, e de outros influentes líderes católicos que defendiam a eliminação dos cassinos. Para Carmela, a prática ia contra os valores da família cristã, e suas pregações nesse sentido foram ouvidas por Dutra, que tomou a decisão de fechar os cassinos.
Alguns relatos indicam que ela insistia no tema, mesmo quando era argumentado que os impostos arrecadados pelo setor financiavam obras sociais de seu interesse. Além da proibição dos jogos, “dona Santinha” também teria influenciado na decisão de Dutra de proibir atividades do Partido Comunista do Brasil (PCB), refletindo sua forte atuação religiosa e anticomunista.
A era de ouro dos cassinos e o impacto da proibição
Entre 1934 e 1946, os cassinos eram plenos centros de entretenimento no Brasil. O Rio de Janeiro, então Capital Federal, atraía turistas e movimentava a economia com grandes eventos nos seus luxuosos cassinos, como o da Urca e o Copacabana Palace. Além disso, cidades como Poços de Caldas e Petrópolis se tornaram polos turísticos, impulsionados pelo glamour desses espaços e dos shows de artistas como Carmen Miranda.
A decisão de Dutra, no entanto, colocou fim a essa era de ouro. Em uma noite simbólica, às 23h de 30 de abril de 1946, o cassino do Copacabana Palace realizou sua última roleta. Essa proibição levou ao fechamento de mais de 70 estabelecimentos e deixou cerca de 60 mil pessoas desempregadas.
No começo dos anos 1990, o bingo voltou a ser legalizado no país. O governo de Fernando Collor permitiu sua operação com o objetivo de levantar fundos para o esporte nacional. Já no início dos anos 2000, durante os mandatos de Fernando Henrique Cardoso e, posteriormente, de Lula, a prática do bingo começou a ser novamente restringida, até ser completamente proibida em 2007.
A volta dos jogos de sorte: uma questão moral ou econômica?
Com a proibição, os jogos de cassino se tornaram um tabu no Brasil, especialmente sob o olhar de setores conservadores e religiosos. Essa resistência permanece nos dias atuais. Em 2023, por exemplo, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) emitiu uma nota pedindo que o Legislativo rejeitasse o projeto de legalização dos jogos de sorte, argumentando que ele seria um “desprezo à vida e à família”.
Por outro lado, defensores da legalização argumentam que a proibição de quase 80 anos não refletiu em uma eliminação real da prática. O Brasil continua jogando, seja em apostas ilegais ou em plataformas online que funcionam fora do país. Estima-se que o mercado ilegal de jogos movimenta bilhões de reais anualmente. Nesse sentido, a regulamentação dos cassinos e bingos poderia gerar receitas para o governo, além de criar empregos e fomentar o turismo.
O Projeto de Lei 2234/2022, que tramita atualmente no Senado visa legalizar cassinos em polos turísticos ou em complexos de lazer, como hotéis de luxo. A ideia é que cada estado tenha pelo menos um cassino, com exceções para estados maiores, como São Paulo, que poderia ter até três. Essa regulamentação poderia, além de trazer benefícios econômicos, possibilitar a fiscalização do setor e arrecadar impostos.
Embora o presidente Lula tenha sinalizado que sancionaria a lei caso fosse aprovada, ele destacou que a legalização desses jogos não resolveria os problemas econômicos do país.
As apostas esportivas e o mercado atual
Em contraste com os jogos de azar, as apostas esportivas já avançaram em sua regulamentação. Desde a sanção da lei de 2018 que permitiu as apostas de cota fixa, o setor cresceu rapidamente. A partir de outubro de 2024, apenas empresas que solicitaram autorização ao Ministério da Fazenda podem operar legalmente, com a regulamentação completa prevista para janeiro de 2025.
O governo espera que essa regulamentação aumente a arrecadação, gerando fundos para investir em áreas essenciais. A legalização também busca tornar o mercado mais transparente e seguro, além de reforçar a fiscalização contra práticas ilegais.
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Tiara De Aguiar, baiana de Salvador, cresceu acompanhando futebol em família e sempre jogava como goleira nas aulas de educação física. Viveu quase uma década em Buenos Aires, onde nasceu seu amor pela seleção alviceleste e pelo San Lorenzo. Formada em Comunicação Social e Design, explorou a moda sustentável e descobriu talento para a gastronomia. Mas foi na mídia esportiva e na pesquisa sobre o universo do iGaming que encontrou uma forma de unir a paixão pelo esporte e a conexão com o mundo!