POR QUE NOSSOS ESTÁDIOS NÃO APRESENTAM O CONFORTO DE UM CINEMA?
A fase de oitavas de final da Copa do Brasil marcou a estreia da competição no sistema pay-per-view (PPV). Por ora nenhum jogo exclusivo do sistema. Existe a promessa de Sampaio Correia versus Palmeiras estar exclusivo do PPV. Claro que isso é uma disputa comercial entre a detentora dos direitos e alguns clubes partícipes. Mas, seria interessante se este expediente acontecesse deste a primeira fase da Copa. Mostrar vários jogos no sistema privilegiando confrontos que hoje acontecem apenas via rádios. Seria um passo interessante para a profissionalização do nosso futebol. Este é o tema que a coluna de hoje deseja explorar.
A profissionalização passa necessariamente pela transformação de clubes em empresas. Acredito que esta transformação não afetará a paixão do torcedor. O que afeta o futebol, de fato, são administrações pautadas pela paixão superior a uma razão instrumental. Alguns exemplos pelo Brasil perambula em divisões inferiores. O “novo” RedBull Bragantino na Série B, a Ferroviária de Araraquara, Ituano e Tubarão na Série D. O time de Santa Catarina funciona com uma lógica de startup ligada a uma universidade. Chego nestes por causa do Brusque Futebol Clube que nos últimos dias teve anunciado as imagens da Arena Havan que será construída na cidade. A administração do time passará por um grupo especializado em gestão, que junto ao novo estádio terá como meta chegar na Série B do Brasileiro num espaço de dez anos. Salvaguardando a péssima tendência estética do grupo Havan, que faz paradoxo com um discurso alienado em camisas verde- amarelas da empresa, a iniciativa merece certo crédito. Porém, há de se considerar uma perspectiva de profissionalização na gestão do futebol. Não há como fazer futebol com paixão de torcedor. Esta paixão contamina o desenvolvimento do esporte e nos deixa cada vez mais distante do futebol organizado do mundo europeu. A lógica do projeto de domínio Havan, está no estádio e passa pela estrutura administrativa do clube.
Na contrapartida destas iniciativas temos algumas aberrações. Uma delas é o contrato individual dos clubes da principal divisão com a televisão. Chegamos a mais uma rodada com dois clubes fora do PPV e um deles fora da televisão aberta. Não há como conceber isto como vetor de normalidade. As competições mais rentáveis do mundo da bola são vendidas em conjunto. Valorizar o produto e não apenas o participante individualmente. Outro exemplo aberrante foi a notícia da venda do clube Força e Luz, do Rio Grande do Norte. Em contato com o clube não houve confirmação, como também, negação da notícia. Há rumores, que após a queda do estadual o clube foi vendido para um empresário que ofertou uma “casa de praia” no negócio. No mínimo folclórica a negociação e longe de uma perspectiva de gestão do clube, mas como aventura de fazer futebol.
Pensar o futebol a partir de práticas eficientes de gestão podem apontar uma saída ao futebol brasileiro. Quando falo em saída, penso que ele está preso. Uma seleção com jogadores atuando predominantemente no futebol europeu; perdemos jogadores para mercados secundários, como o Chinês e para o “mundo árabe”; dificuldade para vender a competição para canais internacionais; futebol de qualidade duvidosa e poucos treinadores brasileiros nas principais ligas europeias. São apenas alguns exemplos para dizer que precisamos de uma saída. Esta necessidade me faz ponderar três possibilidades.
A primeira delas, pensar o profissionalismo na gestão. Os clubes citados da Série D pensam o futebol como uma estrutura de negócios e com metas. Mas para chegar a este dispositivo precisamos nos livrar do caráter de associação dos times; da relação promíscua com as federações; com as ditaduras presidenciais nos times. Trabalhar com capital aberto e com profissionais nas áreas que se fazem necessárias para o futebol, não digo apenas o business, mas toda uma estrutura. O segundo ponto a superação dos interesses pessoais. O direito de arena no Brasil não foi a votação, como alteração na Lei Pelé, por conta do jogo de interesses de um determinado deputado com uma relação, no mínimo duvidosa, com um canal de televisão. E o terceiro ponto necessitamos de uma metodologia para pensar o futebol. Sugiro a Teoria do caos – sem trocadilhos.
Albio Melchioretto albio.melchioretto@gmail.com @professoralbio |
Não quero usar a Teoria do Caos para afirmar que a queda de um apito no jogo amistoso entre Guarani de Caxambu versus Unidos do Fernando de Noronha promoverão o fim do futebol. A escolha da RedeTV! na única tentativa democrática para vender os direitos de imagem do Brasileirão de 2011, tem relação direta com os jogos não mostrados na televisão aberta e PPV em 2019. Mas afirmar que a simples profissionalização da gestão do futebol nos clubes poderá reterritorializar o Brasil novamente como o país do futebol. A reconstrução é um processo sistêmico. Se há uma gestão no clube, ela trabalhará com métricas pensando sua participação. Isto afetará o tratamento com os atletas, ofertando dignidade humana e formação intelectual; passará pelo cuidado das competições e o respeito com o torcedor.
E por falar em nós, insistentes torcedores, perguntar não ofende, por que nossos estádios não apresentam o conforto de um cinema?
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Henrique Neves é antropólogo por formação, mas esportista por natureza. Apaixonado por vôlei, aprendeu a jogar ainda pequeno. Escreve sobre esportes e ama praticar esportes radicais. É formado em Comunicação pela PUC-Rio. Fã de Vinicius Jr, torce pelo Flamengo.